sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Eu deveria estar dormindo,
Sonhando,
Ou não...

Eu deveria estar repleto de metáforas,
Figuras de linguagens,
Ou não...

Eu deveria ser só hipérboles,
Exageros,
Ou não...

A verdade é que se fosse diferente,
Não seria nós.

Se fosse muito mais do que é,
Seria pouco.

Se fosse muito menos do que é,
Faltaria o dobro.

Quem diria que ia ser amor?

Outros que viram de lá,
Disseram que bem tu não fazes.

Outros que viram daqui,
Disseram que nunca fui tão feliz.

Ah, guria, que ousadia minha chegar até aqui.
Que ousadia tua de não me impedir.


Atrevimento,
Esse nosso,
De se amar tanto assim.


domingo, 27 de julho de 2014

AF:. Fila do pão

Encontrei a mãe dela hoje.
Na maldita fila do pão...

Ela tava comprando pães 
E eu, adivinhe...cigarros.

Tentei fingir que não era eu
E quase funcionou, mais um pouco
E ela não me acharia atrás da barba.

Mas ela reconheceu.
Ela me viu embaixo daquilo,
Do misto de decadência e pelos. 

Uma conversa breve.
Sempre tão agradável.
Por um segundo achei que sairia ileso.

"Uma pena não ter dado certo,
Tu era o genro que sempre quis.
Adoraria ser avó dos teus filhos."

Se haviam dúvidas quanto ao efizema,
Ali eu tive certeza. Perdi todo meu ar.

Sai sutilmente apressado e fui.

Nem Deus sabe em que direção.
Só consegui pensar: filhos.

Imaginei ela grávida
Imaginei o parto
Imaginei dois
Imaginei crianças 
Imaginei domingos 
Imaginei uma família.

Espera.
Não, não vai.
Pode ficar, eu pago pela noite toda. 

Preciso terminar essa história. 

AF:. Sala de estar

Já não recordo de como era antes,
Antes de ti.

Tudo na minha sala já me é tão familiar.
Não faz sentindo ter sido diferente.

Mas era.
Nada era do jeito que é.
Não até tu decidir se mudar pra cá.

Tu disse que já éramos crescidos,
Que não tinha porque não
E que eu era covarde pra amar. 

Tu veio. Mudou tudo.
Eu gostei tanto. Eu amei tudo.
Todos os móveis da sala.

Até a primeira vez que tu,
Sem dizer os porquês,
Foi pro sofá no meio da noite.

Quase um ano até desfazer as caixas,
Menos de trinta minutos até tu fazer 
Aquelas malditas malas.

O decorador que ia "repaginar"
Todo o nosso lugar, 
Aguarda a minha ligação...

Há três anos. 

- Alô. 
- Boa noite, dotô. É aquela moça. 
- Boa, seu João.

Pode mandar subir. 

AF:. Pigarro

Essa tosse não passa.

O pigarro já nem incomoda mais 
Mas a tosse, essa sim me irrita,
Me irrita tanto.

Entrelaçados,
Rouquidão e a tosse seca,
Ditam o ritmo dos meus contos.

Uma dose ou duas de vodka,
Talvez ela aqueça minha garganta
E quem sabe, aqueça algo a mais. 

Outra crise de tosse. 

Essa tosse toda,
Parece que é meu corpo
Tentando expurgar algo....

...Não me espantaria se fosse você. 

Talvez eu deva ir ao médico, 
Ou parar de fumar,
Ou cessar as noites no sereno.

Mas nós sabemos que não seria eficaz
A minha cura vai aquém do meu corpo.

Não seria um remédio,
Não seria o título de Doutor 
E muito menos uma sombrinha.

No dia em que eu
Cuspir todo o pigarro
Misturado com teus restos
E teus dejetos 

A tosse cessará. 

AF:. Paloma

Arthur. Arthur Fernandes.
Meu nome.

Mas não era o que soava,
Destilado na tua boca parecia código.

Tu sabia que era eu,
Tu tem o meu número
E ainda sim, tu pergunta: -Qual Arthur? 

E não me escandaliza. É o praxe. 

Arthur, Artur, Silva, Souza
Quantos são? 
Nunca ousei perguntar.
Até hoje.

Se já não bastassem as antíteses..
Eu tenho que lidar com os paradoxos.
Como alguém tão cheio de alguens,
Me faz sentir único? 

É o teu trabalho. 
Tu não sabes mas é a poeta entre nós.
 
Constrói a melhor metáfora, 
Imprime a mais forte catarse,
Usa de todo o universsalismo
E faz de mim, um leitor extasiado. 

Tudo sem proferir uma única palavra. 



Pseudônimo

A.F: Arthur Fernandes. Escritor. Ainda que tenha conflitos constantes com a editora, bem sucedido. Arthur mora no Rio de Janeiro mas é paulista e as vezes morre de saudade do caos urbano porém não se imagina sem a boêmia carioca. Bebe pouco mas fuma demais, 2 ou 3 maços de cigarro não bastam pra um dia. Mas nem sempre foi assim, antes de seu relacionamento acabar ele fumava menos. Manoela e Arthur namoraram um ano e moraram juntos três. Ela decidiu embora. Ele nunca mais foi o mesmo. Hoje em dia, ele passa a maior parte do tempo na rua, observando pessoas, vivendo a vida de outros e escrevendo sobre nada. Sua única relação estável desde então, é Paloma. Uma prostituta que ele conheceu numa noite em que os amigos decidiram que iam "resgata-lo". Mas a maior parte do tempo, não há sexo, ele paga pra ser ouvido, ele paga pra cozinhar pra ela ou perguntar que camisa usar em uma entrevista. Arhur. Arthur Fernandes.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Ágora

Sobre a mesa vermelha:
Meu maço.

Ao meu redor
Três filósofos bêbados.

E eu. 
Eu que já não fujo mais de mentiras 
Ouço atento a toda aquela filosofia.

Religião, política, futebol 
As catástrofes do jornal 
As tragédias não anunciadas
O filho da vizinha que morreu 

Tanto que se diz, pouco que se ouve.
No tanto que se ouve, não há o que dizer.

A noite gelada me lembra o teu corpo 
Mas jurei que hoje não iria precisar de ti.

A Ágora se desfaz 
Os três filósofos bêbados 
São três bêbados filósofos.

Imerso no momento, me questiono:
Onde estará você essa noite? 
Em que casa,
Carro,
Rua,
Chão,
Bar,
Motel? 
Não quero saber. 

Eu jurei que não ia precisar de ti
Não essa noite.

Meu nome é sussurrado 
Acabou o expediente
Fechamos o bar.

Dos filósofos já não sei mais,
Os maços já se foram,
As mesas se empilharam. 

E tu? Cadê? 

Juro que é só mais uma vez.